O Natal está quase a chegar e as preocupações com a
Árvore de Natal, o Presépio, a Iluminação de Natal, os Presentes, a Ceia de Natal e o Almoço de Natal quase não lhe deixam tempo livre.
Por isso antecipamos a sugestão de leitura de fim de semana
para hoje.
Não vamos sugerir um livro, mas antes um Conto de Natal,
do escritor José Viale Moutinho, publicado no Jornal de Letras de 14/12/2011.
As Hesitações dos Reis Magos
Ouro, incenso e mirra, os Reis Magos mastigavam as palavras, procuravam atropelar os conceitos enquanto bebiam chá de termo que Belchior colocara numa pedra.
Baltasar já apresentara a proposta de, a partir daquele oásis, irem num só camelo.
Gaspar dizia que o Menino não repararia na falsidade do ouro, o Carpinteiro também não distinguiria o areão amarelo do pechisbeque e Maria estaria preocupada com outros problemas na miserável cabana em que viviam.
Depois, como não se tratava de uma Fábula, mas de um Conto de Natal, nem a Vaca nem o Burro poderiam falar. Além disso, a Vaca era a eterna enganada, daí os cornos, e o Burro era mesmo burro.
Depois, o incenso sempre foi algo incómodo para os humanos, mesmo nos templos, e a mirra... sugeriu Belchior: Aposto que nem o tipo que está a escrever isto sabe o que é!
Baltasar, amargo, concluiu: Que merda de Natal o deste ano, pois vocês sabem o que me aconteceu?
Gaspar respondeu logo que decerto acontecera o mesmo a todos: os seus réditos haviam sido confiscados pela metade pelo Great Rabbit da Galileia, o que lhes condicionava as homenagens ao Rei dos Reis do costume.
E o que dirá o puto quando nos vir chegar num só camelo e com tão miseráveis prendas?
Belchior, em trejeito infeliz, aventou que a Criança Divina faria birras, mas decerto já adivinhara o que se passara no Celeste Reino Fiscal. E o Senhor Deus, lá em cima, o que sabe tudo, seu pai, com os seus trovões, raios e coriscos, não nos castigará?
Ora, tentou explicar Gaspar o mistério da omnipotência, e Ele não foi quem inventou o Great Rabbit? Também tem culpas no cartório!
Ora se tem, o magano! Mas, ó meu querido irmão Gaspar, quem se trama somos nós, o grande Deus assobia para o lado e o Menino está-se nas tintas: aos 33 deixa-se crucificar, morrer e enterrar e ao terceiro dia desanda para o Céu e nós ficamos a braços com o Great Rabitt.
E o carpinteiro? Esse sai de circulação, como sempre.
E a Mãe? Demora, mas também ascende.
E a Vaca? Nunca se sabe o que lhe acontece.
E o Burro? Esse vai dar uma volta até ao ano.
O único que quase se safa é um tal Herodes, que se entretém a matar criancinhas, mas não acerta naquela que quer apanhar, no Rei dos Reis. Então vou ali à tenda daquele judeu que está a rir-se e já venho. Vou saber preços.
E assim como foi, Belchior veio, mas escandalizado: O ouro não subiu de preço, mas ele compra e não vende, o que subiu foi a taxa, que vai em 57%, o incenso a 49.6% e a mirra só de importação, só para março. Tem ali um pedacinho do ano passado, mas a taxa é a 87%, e por ser para nós.
Disseste-lhe quem somos?
Por isso mesmo. E aluga-nos estábulo para os dois camelos.
E que lhe disseste?
Que fosse à merda.
E ele?
Que queria lá saber, que o que mais há são reis magos, magros, ou coisa assim. Por causa da crise. Então é melhor irmos andando para a Nazaré.
Vamos lá. Mas, ó Belchior, a estrela que nos guia está a ir para a esquerda e nós para a direita.
Gaspar, meu irmão, mas queres cumprir a tradição ou obedecer às diretrizes do Great Rabbit?
E Gaspar, titubeante, quis saber se o Great Rabbit pensava por si ou tinha um chip da Maior Ângela que Ele. Mas nem os magos nem o camelo souberam responder.
Porém, ao longe, os chacais do orçamento estavam atentos.
FELIZ NATAL
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