junho 28, 2019

O QUE QUER QUE CAIA DO CÉU NÃO DEVE SER AMALDIÇOADO



Elif Shafak, escritora e colunista turca, nasceu a 25 de outubro de 1971, em Estrasburgo, França.
A crítica tem-na aclamado como uma das vozes mais originais da literatura contemporânea, tanto em língua turca como em inglesa.
É formada em ciência política e tem lecionado em várias universidades dos Estados Unidos da América, do Reino Unido e da Turquia. 
Autora de uma obra que inclui ficção e ensaio, está traduzida em 40 países, e foi distinguida, entre outros, com o título de Cavaleiro da Ordem das Artes e Letras francês em 2010.
Crítica do regime de Erdogan, tem-se distinguido na defesa dos direitos das minorias nos artigos que publica, quer na imprensa anglo-americana quer na turca.
Para Elif Shafak o Islão não é incompatível com a democracia e ser muçulmano não colide com as liberdades individuais.

O romance que hoje sugerimos para leitura do seu fim de semana, A Bastarda de Istambul, foi bestseller na Turquia e levou a autora a tribunal, acusada de "denegrir a identidade turca", sob o artigo 301º do Código Penal turco, que prevê uma pena até três anos de prisão. Em 2006 os juízes decretaram que as personagens do seu romance proferiam heresias. 
A autora ousou tocar num ponto sensível aos turcos, o genocídio Arménio. Graças aos protestos internacionais Elif Shafak escapou à prisão.

"Um verdadeiro prazer"
                                                             The Times



Numa tarde de chuva em Istambul, uma mulher entra num consultório médico. "Preciso de fazer um aborto", declara. Tem dezanove anos de idade e é solteira. O que acontece naquela tarde mudará para sempre a sua vida. 
Vinte anos mais tarde, Asya Kazanci vive com a sua família alargada em Istambul. Devido a uma misteriosa maldição que caiu sobre a família, todos os homens kazanci morrem aos quarenta e poucos anos, e por isso é apenas uma casa de mulheres. Entre estas destaca-se a bela e rebelde mãe de Asya, Zeliha, que dirige um estúdio de tatuagens; Banu, que recentemente descobriu que é vidente; Feride, uma hipocondríaca obcecada com a iminência da tragédia.
Quando a prima de Asya, Armanoush, uma arménio-americana, vem para ficar, segredos de família há muito tempo escondidos, relacionados com o passado tumultuoso da Turquia, começam a ser revelados.

Sultão, o Quinto em Istambul

"O gato levantou-se devagar com um profundo descontentamento 
e esticou as patas antes de voltar a entrar em casa. 
Outra gota. Apressou o passo.
Talvez não conhecesse as regras.
 Só não sabia que o que quer que caia do céu não deve ser amaldiçoado.
E isso inclui a chuva."



BOA LEITURA



junho 19, 2019

PARABÉNS LÍDIA JORGE

O Grande Prémio da Literatura é um concurso nacional, promovido pelo grupo DST há quase 25 anos, que distingue, rotativamente, livros de prosa e poesia publicados nos dois anos anteriores.


Este ano, a 14 de junho, O Grande Prémio da Literatura
foi atribuído à escritora Lídia Jorge
com o seu romance Estuário, publicado em maio de 2018.

O júri, composto pelos escritores Vítor Aguiar e Silva, José Manuel Mendes e Carlos Mendes de Sousa, decidiram atribuir o prémio ao romance da escritora "pela elevada qualidade da sua escrita, absorvendo e reelaborando fragmentos de um quotidiana mutacional, com fortes sequências efabulatórias e personagens com notória densidade social e psicológica".

O prémio, no valor de 15 mil euros, será entregue no dia 28 de junho, no Theatro Circo, no âmbito da inauguração da Feira do Livro de Braga.



Estuário é um livro sobre a vulnerabilidade de um homem, de uma família, de uma sociedade e do próprio equilíbrio da Terra, relatados pelo olhar de um jovem sonhador que se interroga sobre a fragilidade da condição humana.
Edmundo Galeano andou pelo mundo, esteve numa missão humanitária e regressou à casa do pai sem parte da mão direita. Regressou com uma experiência para contar e uma recomendação a fazer por escrito, e na elaboração desse testemunho passou a ocupar por completo os seus dias. Porém, ao encontro deste irmão mais novo da família, vem ter sem remédio as vicissitudes diárias que desequilibram a grande casa do Largo do Corpo Santo. Edmundo vai-se, então, apercebendo que as atribulações longínquas mantêm uma relação directa com as batalhas privadas travadas a seu lado. E a sua mão direita, desfigurada, transforma-se numa defesa da invenção literária perante a crueza da realidade.




"Iria começar, no dia seguinte, 
um livro antigo, de muitas páginas..."



junho 14, 2019

RETRATO DE PORTUGAL E DO MUNDO VISTO POR UM AUTOR DIFERENTE DE UMA FORMA DIFERENTE



No passado dia 8 de junho foi apresentado, por Cruzeiro Seixas, na Feira do Livro de Lisboa, o terceiro volume das obras completas  do escritor surrealista português Mário-Henrique LeiriaManifesto, Textos Críticos E Afins é, segundo a editora E-Primatur, um "retrato de Portugal  e do mundo visto por um autor de uma forma diferente".


Mário-Henrique Leiria (1923-1980) é, segundo a sua editora, o "expoente máximo do surrealismo português, foi um obreiro das literaturas alternativas, quer como escritor, experimentalista sempre, brilhante eternamente. Autor de culto, é certamente uma das vozes mais originais e invulgares das letras lusas do século passado".




Mário-Henrique Leiria nasceu em Lisboa em 1923. Frequentou a escola de belas Artes, donde saiu apressadamente. Entre 1949 e 1951 participou nas actividades da movimentação surrealista em Portugal. Depois começou a andar de um lado para o outro. Teve vários empregos, marinha mercante, caixeiro de praça, operário metalúrgico, construção civil (não, não era arquitecto, carregava tijolo), etc., pelas terras onde andou: a Europa cristã e ocidental, o Mediterrâneo norte-africano, o Oriente médio e até, dizem, os países socialistas. Não ia aos Balcãs porque tinha medo, todos lhe diziam que lá os bigodes eram enormes e  as bombas estoiravam até no bolso. Um dia teve que passar por lá. Os bigodes eram realmente grandes, mas toda a gente sabia rir. Tirou o casaco e bebeu que se fartou.
Em 1958 meteram-lhe ideias na cabeça e foi até Inglaterra, para aprender coisas. Não aprendeu e voltou. Entre 1959 e 1961 foi casado e não fez mais nada. Em 1961 foi para a América Latina donde voltou nove anos depois. Por lá, conseguiu ser, entre outras actividades menos respeitáveis, planejador de stands para exposições, encenador de teatro e até director literário de uma editora. Fizera progressos. Agora está chateado, vive em Carcavelos e custa-lhe muito andar.
Tem colaborado em várias revistas e jornais nacionais e não só. Está publicado em algumas antologias, tanto aqui como no estrangeiro. Este é o primeiro livro que tenta publicar em Portugal.
Realmente, está muito chateado. (1973)


A Biblioteca Municipal possui,
 para empréstimo domiciliário,
 os dois volumes dos Contos do Gin-Tonic.





TORAH

Jeová achou que era altura de pôr as coisas no seu devido lugar. Lá de cima, acenou a Moisés.
Moisés foi logo, tropeçando por vezes nas lajes e evitando o mais possível a sarça ardente.
Quando chegou ao cimo, tiveram os dois uma conferência, cimeira, claro. A primeira, se não estou em erro.
No dia seguinte Moisés desceu. Trazia uma tábuas debaixo do braço. Eram a Lei.
Olhou em volta, viu o seu povo aglomerado, atento, e disse para todos os que estavam à espera:
- Está aqui tudo escrito. Tudo. É assim mesmo e não há qualquer dúvida. Quem não quiser, que se vá embora. Já.
Alguns foram.
Então começou o serviço militar obrigatório e fez-se o primeiro discurso patriótico.
Depois disso, é o que se vê.
In, Contos do Gin-Tonic



A Leitura ideal de fim de semana para acompanhar o seu gin-tonic




junho 04, 2019

QUANDO APRENDI A LER, NO MUNDO FEZ-SE LUZ E PASSEI A COMPREENDER TUDO


Hoje é dia de luto nacional



"Há personalidades que nenhumas palavras podem descrever no que foram e no que significaram para todos nós. Agustina Bessa-Luís é uma dessas personalidades. 
Como criadora, como cidadã, como retrato da força telúrica de um povo e da profunda ligação entre as nossas raízes e os tempos presentes e vindouros. De "antes quebrar do que torcer" testemunhou com o rigor inexcedível da sua escrita, nunca corrigida, o fim de um Portugal e o nascimento de outro. Um e outros feitos do Portugal eterno. E é a esse Portugal eterno que ela pertence."
Marcelo Rebelo de Sousa




Além de romances, Agustina Bessa-Luís escreveu também peças de teatro, guiões para televisão, várias biografias romanceadas e literatura infantil.
O realizador Manoel de Oliveira adaptou para o cinema muitas obras da autora.




Conciliou a sua atividade literária com outros projectos: 
  • 1961/1962 - Foi membro do Conselho Diretivo da Comunidade Europeia dos Escritores 
  • 1986/1987 - Foi editora do jornal O Primeiro de Janeiro
  • Nos anos 90 Fez parte da direção do Teatro Nacional D. Maria II
  • Foi membro da Alta Autoridade para a Comunicação Social.


Distinções e Prémios
  • 1975 - Recebeu o Prémio "Adelaide Ristori" - Centro Cultural Italiano de Roma
  • 1980 - Foi Distinguida com o grau de Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago de Espada
  • 1980 - Ganhou o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores com o livro O Mosteiro .
  • 1988 - Recebeu a Medalha de Honra da Cidade do Porto e o grau de Oficial da Ordem das Artes e Letras de França
  • 2001 - Ganhou o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores com o romance O Principio da Incerteza.
  • 2002 - Recebeu o Globo de Ouro
  • 2004 - Recebeu o Prémio Vergílio Ferreira (atribuído pela Universidade de Évora) pela sua carreira como ficcionista
  • 2004 - Recebeu o Prémio Camões - "o júri tomou em consideração que a obra de Agustina Bessa-Luís traduz a criação de um universo romanesco de riqueza incomparável que é servido pelas suas excepcionais qualidades de prosadora, assim contribuindo para o enriquecimento do património literário e cultural da língua comum." 
  • 2005 - Foi-lhe atribuído o título de doutor honoris causa pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto
  • 2005 - Recebeu o Prémio de Literatura do Festival Grinzane Cinema de Turim (Itália)
  • 2006 - Foi elevada ao grau de Grã-Cruz da Ordem de Sant'Iago.




"Nasci escritora e tenho o gosto da escrita.
Depois vem a relação com o público e com todos
 estes fantasmas que são as memórias".




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