dezembro 29, 2022

FELIZ 2023

 






Temos de Ser Mais Humanos


Abram os olhos. Somos umas bestas. 
No mau sentido. Somos primitivos. Somos primários.
Por nossa causa corre um oceano de sangue todos os dias. 
Não é auscultando todos os nossos instintos ou encorajando a nossa natureza biológica a manifestar-se que conseguiremos afastar-nos da crueza da nossa condição. É lendo Platão. E construindo pontes suspensas. É tendo insónias. É desenvolvendo paranoias, conceitos filosóficos, poemas, desequilíbrios neuroquímicos insanáveis, frisos de portas, birras de amor, grafismos, sistemas políticos, receitas de bacalhau, pormenores.

É engraçado como cada época se foi considerando "de charneira" ao longo da história.
A pretensão de se ser definitivo, a arrogância de ser "o último", a vaidade de se ser futuro é, há milénios, a mesmíssima cantiga.

Temos de ser mais humanos. Reconhecer que somos as bestas que somos e arrependermo-nos disso. Temos de nos reduzir à nossa miserável insensibilidade, à pobreza dos nossos meios de entendimento e explicação, à brutalidade imperdoável dos nossos atos. O nosso pé foge-nos para o chinelo porque ainda não se acostumou a prender-se aos troncos das árvores, quanto mais habituar-se a usar sapato.

A única atitude verdadeiramente civilizada é a fraqueza, a curiosidade, o desespero, a experiência, o amor desinteressado, a ansiedade artística, a sensação de vazio, a fé em Deus, o sentimento de impotência, o sentirmo-nos pequeninos, a confissão da ignorância, o susto da solidão, a esperança nos outros, o respeito pelo tempo e a bênção que é uma pessoa sentir-se perdida e poder andar às aranhas, à procura daquela ideia, daquela casa, daquela pessoa que já sabe de antemão que nunca há-de encontrar.

O progresso é uma parvoíce.
Pelo menos enquanto continuarmos a ser os animais que somos.
                                                                                                                   
                                                                                                                   Miguel Esteves Cardoso, 
                                                                                                                   In Explicações de Português









FELIZ 2023

dezembro 22, 2022

FELIZ NATAL

 


"Sei que o Natal não tem o mesmo significado para toda a gente. Mas é para quase todos nós uma festa de família. E isso é quanto basta para que, de algum modo, possamos sentir-nos unidos uns aos outros nesta data.
Por mim, recordo a ansiedade pelos presentes quando criança, o amor imenso dos meus avós pelos netos, a ternura dos meus pais e dos meus irmãos e a alegria dos meus filhos. Tudo isto vivido, às vezes, com alguma dificuldade para satisfazer os horários dos almoços e jantares da família de origem com os daqueles que, por escolhas pessoais, se haviam tornado também nossas. Lembro ainda os amigos e as amigas que por estarem sozinhos sempre agregámos aos nossos festejos. (...)




No último Natal estive rodeada dos meus, envolvida de carinhos do filho, da cunhada, do neto mais velho, do mano mais novo, dos sobrinhos e dos filhos destes.
A nossa família é assim. Gosta de afeto, de se anichar no colo mais próximo, de dar beijos e abraços, de rir e da bagunça das crianças.
Matei saudades de cada um, estive agarrada ao meu neto, que, apesar dos seus vinte anos, gosta das ternuras da avó, e senti, uma vez mais, que sem os meus jamais seria quem sou."

                                                                                               Helena Sacadura Cabral
                                                                                               In, Erros Meus, Má Fortuna, Amor Sempre?






FELIZ NATAL






dezembro 20, 2022

TOLERÂNCIAS DE PONTO

 Na sequência das tolerâncias de ponto concedidas pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal, 
informamos que iremos estar encerrados nos 
dias 23, 26 e 30 de dezembro.





dezembro 14, 2022

ÁRABE SIGNIFICA TER A MERCEARIA ABERTA À NOITE E AO DOMINGO

 Duas gerações diferentes
Duas religiões distintas
Uma amizade única
Omar Sharif e Pierre Boulanger

"O senhor Ibrahim sempre fora velho. Os habitantes da Rua Bleue e da Rua do Faubourg-Poissonnière sempre tinham visto o senhor Ibrahim na sua mercearia, desde as oito da manhã até noite cerrada, curvado entre a caixa e os produtos de limpeza, uma perna cá fora e outra debaixo das caixas de fósforos, um casaco cinzento por cima de uma camisa branca, dentes cor de marfim escondidos sob um bigode farto, olhos cor de pistácio, verdes e castanhos, mais claros do que a sua pele morena, marcada pela sabedoria que a vida lhe trouxera.


Omar Sharif, Cesar 2004 melhor ator

Era opinião generalizada que o senhor Ibrahim era sábio. Provavelmente por ser, há cerca de quarenta anos, o único árabe numa rua de judeus. Sem dúvida também porque sorria muito e falava pouco. (...)
- Eu não sou árabe, Momo, eu sou do Crescente Dourado. (...)
- Eu não sou árabe, Momo, sou muçulmano.
- Então porque dizem que o senhor é o árabe da rua se nem sequer é árabe?
- Árabe, Momo, quer dizer mercearia "aberta das oito da manhã à meia-noite, mesmo ao domingo." 




Momo é um rapazinho que se aborrece na escola e em casa, junto do seu pai, um advogado infeliz. Porém, na Rua Bleue onde mora, há mulheres pouco recomendáveis que o tratam muito bem e, acima de tudo, há o senhor Ibrahim, o merceeiro árabe do bairro, que parece conhecer os segredos da felicidade e dos verdadeiros sorrisos, dos quais Momo depressa aprende a tirar partido.
Depois de o seu pai se atirar para debaixo de um comboio, Momo é acolhido pelo senhor Ibrahim. Juntos, vão encerrar a loja, comprar um automóvel e partir para o país natal do velho homem, o país dos dervixes rodopiantes, sábios da contemplação, do Alcorão, das suas flores e da poesia do mundo.


Um livro para ler e reler, uma lição de sabedoria, 
de tolerância, de fatalismo e de bondade.



Éric-Emmanuel Schmitt nasceu a 28 de março de 1960 em Sainte-Foy-lès-Lyon, França.
É um dos mais populares escritores e dramaturgos franceses. As suas obras foram traduzidas e encenadas em mais de 40 países. É considerado um dos 10 autores de língua francesa mais lidos.
Entre os seus prémios contam-se o prestigiado Prémio Goncourt de Romance e ainda o Grande Prémio de Teatro da Academia Francesa.
Em 1999, quando escreveu a peça "O Senhor Ibraim e as Flores do Alcorão", que mais tarde adaptou em formato de novela e que hoje divulgamos, vivia na rue Bleue, onde a parte principal da ação se desenrola. Era um bairro judeu, onde um árabe mantinha a sua loja aberta das 8 da manhã à meia-noite.

O Senhor Ibrahim e as flores do Alcorão foi adaptado ao cinema em 2003, realizado por François Dupeyron, com argumento do próprio autor e do realizador, tendo nos papeis principais Omar Sharif, que venceu em 2004 o Cesar de melhor ator no papel do Senhor Ibrahim, Pierre Boulager e Isabelle Adjani.
Em Portugal, a encenação desta peça por Miguel Seabra em 2012 valeu ao Teatro Meridional o Prémio do Público no Festival Internacional de Teatro de Almada.
Em 2022, para celebrar os 25 anos de existência daquela companhia de teatro, esteve novamente em cena de 6 a 23 de junho.

"Um hino à vida"
                                                 Le Pariscope



dezembro 09, 2022

SE SABE ESCREVER POEMAS, TAMBÉM SABE ESCREVER RECEITAS




"- Um livro de culinária!
Franzo a testa, confusa. O homem é ao mesmo tempo indelicado e obscuro. Quem é que ele pensa que sou? Posso ter trinta e seis anos e ser solteira, o meu vestido pode estar manchado de suor, mas não sou uma serviçal doméstica de avental. (...)
- Mas eu não ... não sei cozinhar - digo sem convicção, e dirijo-me à porta como uma sonâmbula. (...)
- Se sabe escrever poemas, também sabe escrever receitas. (...)
- Bonito e elegante, Miss Acton. Traga-me um livro de culinária tão bonito e elegante como os seus poemas."


O romance inspirado na história real de Eliza Acton,
 que inventou o conceito do livro de culinária moderno, 
é a nossa sugestão de leitura para o seu fim de semana.





Especiarias exóticas, vegetais aromáticos e frutos exuberantes... 
Em 1835, Londres está a transbordar de novos ingredientes que ninguém sabe usar. Tudo isso passa ao lado de Eliza, uma jovem de boas famílias que tenciona dedicar a vida a escrever poesia e a partilhá-la com o mundo. Um sonho grandioso que termina abruptamente quando o seu editor lhe sugere uma mudança de rumo. Se Eliza quer ser publicada, que escreva então algo aceitável para uma menina da sua posição. Como um livro de cozinha.


Para a aspirante a poetisa, que nunca sequer cozeu um ovo, qualquer ligação a um fogão é uma afronta... até ao dia em que a situação familiar a obriga a repensar tudo e a pôr, literalmente, as mãos na massa. Depressa vai descobrir não apenas um talento, mas uma verdadeira paixão. Com a ajuda da sua jovem assistente Ann Kirby, entre papel e tachos, lágrimas e gargalhadas, segredos e confissões, Eliza vai descobrir as maravilhas da gastronomia e o poder da amizade.
Mas quando Ann descobre um segredo do passado dela, tudo o que conquistaram se transforma numa ameaça.

Annabel Abbs nasceu no Reino Unido a 20 de outubro de 1964, é licenciada em Literatura Inglesa. Os seus contos e textos jornalísticos estão publicados no The Guardian, no The Telegraph, na Tatler e na Elle Magazine.
O seu livro, que hoje sugerimos para leitura de fim de semana, foi considerado pelo New York Times Books uma das melhores obras de ficção histórica de 2021, e está a ser traduzido para dezasseis idiomas.

"E começa a falar-me sobre combinações de pós de caril, os benefícios das especiarias frescas, os tamarindos que começou agora a importar ainda na casca. Estou tão absorta que me esqueço completamente da cozinha - e das minhas gafes tão pouco femininas. Ele descreve o sabor fumado dos cominhos, o amargor negro das sementes de fenacho, a opulência doce da polpa de coco fresco, a explosão feroz de raiz de gengibre."




"Tal como um poema, uma receita deve ser clara, precisa e ordenada"
                                                                                                                    Eliza Acton





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