"Tenho de salvar estas pessoas, tantas quantas eu puder. Se estou a desobedecer a ordens, prefiro estar com Deus e contra os homens, do que com os homens e contra Deus".
Aristides de Sousa Mendes foi o "Schindler português" muito antes de o alemão começar a sua actividade humanitária em prol dos judeus. Atendendo à verdade histórica, Oscar Schindler é que foi o Aristides alemão.
Nascido a 19 de julho de 1885, numa família abastada de antigos fidalgos de província, de Cabanas de Viriato, perto de Viseu, Aristides e o irmão gémeo cursaram Direito em Coimbra e seguiram a carreira diplomática. Após o golpe de 28 de maio de 1926, foi colocado em Vigo, num posto prestigiante e de confiança. Seguiu-se Antuérpia, outro posto de confiança, onde ficou 9 anos. Aos 50 anos era decano de corpo diplomático.
Em 1938, após Salazar recusar o seu pedido de permanecer na Bélgica, foi colocado em Bordéus. Em 1939, com o rebentar da II Guerra Mundial e, em 1940, devido à invasão da França pelas tropas alemãs, milhares de refugiados fogem para sul. Os jardins do consulado e as ruas servem de local de acampamento a milhares de pessoas das mais variadas nacionalidades, sobretudo judeus que fogem da perseguição nazi.
Em 1940, Aristides era cônsul de Portugal em Bordéus e, indo contra uma directiva expressa de Salazar para não se concederem vistos a refugiados que quisessem atravessar a França para chegar a Portugal, desobedeceu e passou 30 mil vistos.
"Concede vistos sem olhar a nacionalidades, etnias ou religiões. Graças a ele, Portugal ficou na história como um país que apoiou os refugiados durante a II Guerra Mundial", lembra a historiadora Irene Pimentel.
No dia 24 de junho de 1940 recebe um telegrama de Salazar ordenando-lhe o regresso imediato a Lisboa. "Enfrentou a ira de Salazar, que não poderia permitir que um diplomata desobedecesse às suas ordens", relata Irene Pimentel. Após 32 anos de serviço, Aristides de Sousa Mendes (com uma família de 12 filhos) foi demitido compulsivamente sem direito a qualquer reforma ou indemnização. Foi ainda proibido de exercer advocacia e os filhos de frequentarem a universidade.
Alberga no seu palácio de Cabanas de Viriato muitas das famílias de refugiados, hipotecando para o efeito todo o recheio. A partir de 1941, já na miséria, foi auxiliado pela Comunidade Israelita de Lisboa. Terminada a Guerra, em 1945, fez uma exposição para a reapreciação do seu processo da qual não obteve resposta.
A 3 de abril de 1954 morre, no Hospital da Ordem Terceira, em Lisboa, desonrado e sozinho, acompanhado apenas por uma sobrinha.
Aristides de Sousa Mendes só foi reabilitado nos anos 80 de século XX e muito por pressão exterior. Foi primeiro elogiado nos Estados Unidos e em Israel. Em 1998, a Assembleia da República condecora-o com a Cruz de Mérito, a título póstumo, pelas suas acções em Bordéus. Em 2007, a RTP promoveu a escolha dos dez maiores portugueses de todos os tempos. Aristides de Sousa Mendes foi o terceiro mais votado. Ironicamente, o primeiro lugar foi atribuído a Salazar, e o segundo a Álvaro Cunhal.
"Aristides não tem um monumento em Portugal. Mais do que um monumento, deveria haver simplesmente uma lei que dissesse: A nuvem - aquela coisa efémera - a nuvem mais bonita em Portugal, todos os dias, deveria chamar-se Aristides de Sousa Mendes"
Ferreira Fernandes
A Biblioteca Municipal não quer deixar de prestar uma pequena homenagem a um dos maiores símbolos nacionais da II Guerra Mundial e durante este mês tem patente uma mostra bibliográfica, no átrio de entrada, sobre Aristides de Sousa Mendes e a época em que viveu.
Visite-nos
Sem comentários:
Enviar um comentário