setembro 19, 2019

SOU CULTO INDEPENDENTEMENTE DA MINHA VONTADE


Ainda este mês irá ser publicado pela Antígona o romance 
Uma Solidão Demasiado Ruidosa
do escritor checo Bohumil Hrabal
numa nova edição, daquela que foi publicada em 1992, pela editora Afrontamento, 
também, com tradução do checo Ludmila Dismánova.


Caro Leitor
não precisa de esperar muito mais tempo.
A edição de 1992 faz parte do catálogo bibliográfico da Biblioteca Municipal
e está disponível para empréstimo domiciliário.



Tal como o autor nos anos 50, o herói deste livro, Hanta, trabalha na cave de um depósito de reciclagem. Trabalha com uma velha prensa, e os seus dias passam-se a comprimir livros e papeis. Mas, antes de os destruir, Hanta não pode deixar de observar o que lhe passa pelas mãos: folhear esses livros dá um sentido à sua vida. Separa os Göethe, os Schiller, os Hölderlin, extasia-se perante tanta beleza, e "salva-os" levando-o para sua casa, onde vão invadindo todos os espaços disponíveis. Mal tem espaço para se sentar, deitar ou passar de um compartimento para o outro, e o baldaquim da cama ameaça desmoronar-se. Ou coloca-os, abertos na página de que mais gosta, bem no centro dos papeis a meter sob o pilão da prensa, e envolve o pacote prensado com belas reproduções cuidadosamente escolhidas: vai fabricando fardos especiais, as suas "obras de arte".
A instalação de uma cadeia automática capaz de destruir e comprimir livros em enormes quantidades, e a invasão da sua cave por jovens operários-modelo indiferentes que alegremente alimentam as máquinas ultra modernas - evocação da realidade pós 68 - tornam inútil a função de Hanta. Resta-lhe juntar-se aos seus queridos livros. Um dia, passa por cima do bordo da velha prensa levando numa mão o seu Novalis preferido, e com a outra carrega no botão verde.
Escolheu o seu paraíso.


Uma Solidão Demasiado Ruidosa
 tornou-se uma obra de culto sobre a indestrutibilidade da memória 
e da palavra e o seu poder redentor em tempos bárbaros, afirma a editora.

Bohumil Hrabal e os seus gatos

Bohumil Hrabal nasceu a 28 de março de 1914 em Brno, na Checoslováquia. Fez o curso de Direito em Praga, mas só ocasionalmente o exerceu, tendo sido, ferroviário, viajante comercial, agente de seguros, operário siderúrgico, figurante de teatro.
Viveu a ocupação nazi e a repressão do pós-guerra.
Publicou o seu primeiro livro em 1962, Uma Pérola no Fundo, que provocou enorme alvoroço entre o público, sendo vivamente saudado pela crítica que o elegeu como grande continuador de Franz Kafka.
Continuou a publicar, tendo inclusivamente alguns romances uma versão cinematográfica, como foi o caso de Comboios Rigorosamente Vigiados.
A partir de 1968 a sua obra foi proibida, só voltando a ser publicado em 1976. Não deixou no entanto de ser um dos escritores mais lidos no seu país, sendo a sua obra publicada em "samizdat", uma prática da altura destinada a evitar a censura imposta pelos governos dos partidos comunistas leais à URSS, através da qual algumas pessoas copiavam e distribuíam clandestinamente os livros proibidos.
Morreu a 3 de fevereiro de 1997, após cair da janela do quinto andar num hospital de Praga, quando dava de comer aos pombos.
É considerado um dos maiores escritores checos do século XX, foi toda a vida "compincha de caneca erguida nas tabernas de Praga, amigo da boa cerveja e de gatos (a ordem é aleatória)", escreve a editora. 



"(...) Sou culto independente da minha vontade e, assim, nem sei bem quais as ideias que são minhas, e saídas da minha cabeça, e que ideias li. Foi assim que, durante estes trinta e cinco anos, me liguei a mim próprio e ao mundo à minha volta; é que, quando estou a ler, afinal não leio, apenas colho com o bico uma bela frase e chupo-a como um rebuçado, como se beberricasse um cálice de licor durante muito tempo, até que a ideia se espalhe em mim como o álcool;"


Boa Leitura




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