janeiro 24, 2017

SILÊNCIO



"E se, por hipótese, Deus não existisse mesmo?" hipótese aterradora! Se Deus não existisse, como tudo se tornaria ridículo! Que drama absurdo teriam sido as vidas de Mokichi e Ichizo, amarrados a um poste, batidos pelas vagas! E os missionários, três anos a sulcar os mares para chegarem a este país!...Que tremenda desilusão a deles! E que absurda situação a minha, vagueando por estes desolados montes. (...) O pecado maior contra Deus é o desespero, bem o sabia, mas o silêncio de Deus é que não me dava para entender".
                                                                                            In, Silêncio 
de Shusaku Endo



Em cena no Cinema Teatro Stephens até amanhã, dia 25 de janeiro, o mais recente filme de Martin Scorsese, SILÊNCIO, com a participação de Andrew Garfield, Adam Drives e Liam Neeson ( na foto), entre outros, é uma adaptação de romance com o mesmo nome do japonês Shusaku Endo, e que hoje divulgamos aos nossos leitores.


Considerado o mais importante romance de Shusaku Endo, cuja ação decorre no Japão no século XVII, narra a história de um missionário português envolvido na aventura espiritual da conversão dos povos orientais, o qual acaba por apostatar (renegar a fé cristã), após ter sido sujeito às mais abomináveis pressões das autoridades japonesas, para evitar que um grupo de fiéis seja por ordem delas torturado até à morte.
Antes de chegar ao Japão, a sua viagem levara-o a Goa, depois Macau e, finalmente, a Nagasáqui e Edo, em etapas que pouco a pouco o haviam transportado a esse Oriente hostil, onde no entanto já se contavam alguns milhares de convertidos à fé católica. Aí descobriria, na luta contra as pessoas e o ambiente adversos, a verdadeira fé, liberta de todo o aparato externo, eclesiástico ou mundano. E aí acabaria por experimentar a derradeira solidão, que é o destino daqueles que quebram a comunhão com aquilo que mais profundamente marca a sua identidade.

"Fica-se quase doente ao ler Silêncio, mas rendemo-nos à verdade e força
 dos estados de alma e das confissões das personagens. 
As descrições da natureza são magníficas: 
as estações do ano, as árvores, as cigarras, o concerto dos pequenos animais da floresta"
                                                                                              Urbano Tavares Rodrigues



Shusaku Endo, nasceu em Tóquio a 27 de março de 1923. Católico desde a infância, foi batizado em 1935, aos 12 anos e foi-lhe dado o nome cristão de Paul. Formou-se em Literatura Francesa, pela Universidade de Keio, tendo estudado depois durante algum tempo em Lyon, como bolseiro do governo japonês.
O seu estilo de escrita tem sido comparado ao de Graham Greene, que aliás o considerava um dos maiores escritores do século XX.  Por diversas vezes nomeado para o Prémio Nobel da Literatura, foi galardoado com os mais importantes prémios literários do seu país.
Com o presente romance, o autor mostra que a verdadeira fé, seja ela cristã, budista ou muçulmana, não consiste uma obediência cega dos dogmas religiosos mas, antes, numa constante interpretação das grandes narrativas canónicas e no respeito pelo valor da vida humana.
A 29 de setembro de 1996, faleceu em Tóquio. Vinte anos passados sobre a sua morte, Shusaku Endo continua a ser uma referência para os cristãos japoneses ( 1% da população japonesa) que vivem em constante diálogo cultural e inter-religioso.


Veja o Filme,mas leia também o Livro










janeiro 18, 2017

18 DE JANEIRO DE 1934

Em 18 de janeiro de 1934, eclode, em vários pontos do país, um "Greve Geral Revolucionária" contra o salazarismo. Não podendo contar com a participação da corrente republicana, a revolta é sufocada.
Várias foram as interpretações propostas por estudiosos, sindicalistas e políticos. Mas, após o 25 de Abril, o "18 de janeiro" transforma-se em grande mito revolucionário comunista.


O livro da historiadora Fátima Patriarca, Sindicatos contra Salazar: A revolta do 18 de janeiro de 1934, que hoje sugerimos para assinalar os 83 anos sobre aquela data, é o resultado da leitura minuciosa de quanto se escreveu, desde então, sobre tão importante acontecimento feito lenda.
Ao tentar reconstruir os acontecimentos, com a ajuda de novos elementos e a consulta inédita de arquivos, a autora procura também perceber os mecanismos da criação de um mito.


"Na Marinha Grande, os assaltos à estação dos correios e ao posto da GNR, envolvendo este último o desarmamento e a prisão dos doze elementos que o compunham, a atentado contra a residência de Emílio Galo, a reabertura da sede sindical e os posteriores confrontos com forças policiais e militares de Leiria, apesar da sua indesmentível ousadia e espetacularidade, também não chegam a ser seguidos de greve, quanto mais não seja porque as autoridades militares decretam o estado de sítio a 18 e greve é algo que não chega a existir a 19. (...)
Os cortes de comunicações, ainda que apontados, normalmente, como meios de impedir a ação das forças repressivas, e que na Marinha Grande não são impeditivos de coisa nenhuma, mais não fazem do que isolar, de forma irremediável, as localidades e os focos de revolta, como se os sindicalistas tivessem decidido, exatamente, coartar os seus próprios movimentos e, de algum modo, auto-sitiar-se. (...)
Se nos lembrarmos de que a rendição e prisão dos elementos da GNR local ocorrera entre as 5 e as 6 horas da manhã e se admitirmos que as forças policiais vindas de Leiria entraram na Marinha Grande pelas 7 horas, torna-se evidente que a vila teria estado sob controlo dos revoltosos, sem lutas e sobressaltos, no máximo pouco mais de uma hora. Por fim, com a chegada das forças de Leiria e a debandada dos revoltosos, a insurreição encontra-se terminada, na melhor das hipóteses, pelas 8 horas da manhã.(...)
E o comandante militar, major Jaime da Fonseca, não deixa margem para dúvidas. Em telegrama que dirige ao ministro do Interior, declara ter assumido o "comando militar" e ordenado" a suspensão das garantias". Pelas 11.20, hora a que fora expedido o telegrama, a ordem encontrava-se restabelecida na Marinha Grande e o major informava o ministro de que estava a "proceder às diligências necessárias na vila e mata nacional para a captura dos revoltosos."
Com as fábricas encerradas e o trânsito limitado, greve é algo que deixa de poder existir.
Os únicos factos a registar ao longo do dia 18 situam-se, assim, do lado das forças da ordem, as quais procedem a uma série de buscas e prisões arbitrárias. 
(...) o teste da greve na Marinha Grande ia ser feito, não a 18, mas a 19. E sê-lo-ia em condições particularmente adversas."
                                             Fátima Patriarca,
                                             In Sindicatos contra Salazar: A revolta de 18 de janeiro de 1934


Boa Semana
Com Boas Leituras



janeiro 12, 2017

POIS SIM; MAS EU É QUE NÃO ESTOU PARA O ATURAR

Estreou nas salas de cinema a 5 de janeiro, o filme Zeus, realizado por Paulo Filipe Monteiro.
Não se trata do principal deus da mitologia grega, considerado na Grécia Antiga como o deus dos deuses mas, o nome de um cargueiro, que saiu de Lisboa a 17 de dezembro de 1925 e cujo rumo era a Argélia.
Nele ia, aos 65 anos de idade, Manuel Teixeira Gomes e não mais voltaria à Pátria.
Não levou consigo nem um papel, nem um livro, nada que lhe lembrasse o país. Levou apenas uma mala de roupa que usaria até ao fim da sua vida.
Durante os 15 anos seguintes viveu na cidade argelina de Bougie, no quarto nº 13, do Hotel de L'Étoile, onde retomou a sua atividade literária, desde há muito interrompida, e onde escreveu, segundo os críticos, uma das obras-primas da literatura portuguesa dos século XX, Maria Adelaide, outros outros livros de contos, memórias e cartas.

Bougie, Hotel onde faleceu Manuel Teixeira Gomes a 18/10/1941

Manuel Teixeira Gomes
, representante do Partido Democrático, foi o sétimo presidente da Primeira República Portuguesa, de 6 de outubro de 1923 a 11 de dezembro de 1925, no meio de permanentes convulsões políticas e sociais. A 11 de dezembro de 1925 enviou uma carta de renúncia ao Presidente do Congresso, alegando motivos de saúde, e dando início a um exílio voluntário de 15 anos: " Pois sim; mas eu é que não estou para o aturar", numa alusão ao presidente do Conselho.

Mamuel Teixeira Gomes no seu gabinete em Londres

Político, escritor e diplomata, Manuel Teixeira Gomes, nasceu a 27 de maio de 1862, em Portimão. Aos dez anos mudou-se para Coimbra para estudar no liceu do Seminário Diocesano, onde travou conhecimento com José Relvas. Em Lisboa frequentava regularmente a Biblioteca Nacional e conviveu com João de Deus e Fialho de Almeida. Depois de cumprir o serviço militar fixou-se na cidade do Porto, tendo colaborado com o jornal Primeiro de Janeiro e noutros jornais e revistas de menor expansão. Deixou a vida boémia do Porto e regressou a Portimão a fim de ajudar o seu pai nos negócios familiares. Aí e paralelamente à atividade comercial, continuou a escrever e interessou-se pela atividade republicana local, participando em comícios, reuniões e colaborando no jornal A Luta.
Em 1910, com a Implantação da República, foi nomeado embaixador em Londres, tornando-se assim o primeiro representante da República no Reino Unido. No exercício das suas funções evidenciou-se nas negociações anglo-germânicas, relativas às colónias portuguesas,  na cooperação com os governos portugueses na Primeira Guerra Mundial e integrou os círculos do movimento das sufragistas na capital londrina.
O facto de defender a entrada de Portugal na guerra, trouxe-lhe inimizades, levando-o a pedir a demissão do cargo, facto que só aconteceu em 1918, durante a ditadura de Sidónio Pais, que o mandou regressar a Portugal. Foi-lhe retirado o passaporte diplomático e colocado sob prisão no Hotel Avenida Palace. Depois da queda de Sidónio Pais regressou à atividade diplomática em Madrid e mais tarde em Londres. Em 1922 representou o país na Sociedade das Nações, chegando a ocupar uma das vice-presidências.
Em 6 de agosto de 1923, apoiado pelo partido republicano, vence as eleições à Presidência da República. No entanto o momento não era propício a uma presidência pacífica, dado que as lutas políticas eram intensas. Dececionado com a política, renunciou à Presidência, alegando motivos de saúde.
Parte quase em segredo na cargueiro Zeus com destino ao norte de África.

1950, aniversário da sua morte, o corpo é trasladado para a cidade de Portimão.

Morreu a 18 de outubro de 1941, sendo sepultado no cemitério cristão de Bougie, no jazigo dos proprietários do hotel onde passou os últimos anos. Por vontade da família, os seus restos mortais foram transladados para a sua cidade natal, Portimão, em 1950.

Em março de 2006, na sua última deslocação ao estrangeiro, o presidente Jorge Sampaio deslocou-se à Argélia para inaugurar um busto de homenagem a Manuel Teixeira Gomes e para participar no lançamento de uma antologia sobre o antigo Chefe de Estado Português.

"Pouca gente conhece que tivemos um Presidente da República destes, 
uma pessoa desta envergadura. Um presidente que tenha escrito livros eróticos, 
acho que é único no mundo."
                                                                                                  Paulo Filipe Monteiro


Caro Leitor
aqui fica o convite 
para se deslocar à Biblioteca Municipal
e ficar a conhecer a bibliografia
de um dos nossos Presidente da República. 




janeiro 04, 2017

O BOM DE UM LIVRO É QUE SE LEIA



Umberto Eco, filósofo, semiólogo, linguista, historiador e escritor, considerado um dos maiores estudiosos da ciência da comunicação,  nasceu em Alexandria, na região do Piemonte, Itália, a 5 de janeiro de 1932. 
Cresceu durante a II Guerra Mundial, estudou filosofia e estética e formou-se com uma tese sobre a estética de São Tomás de Aquino. Em 1954, foi trabalhar na RAI, a televisão pública italiana, onde esteve durante cinco anos como editor cultural. A partir da década de 1960 foi professor convidado em inúmeras prestigiadas universidades, tais como a New York University, columbia, Yale, Cambridge, Oxford, Harvard, entre outras, tendo recebido o título de Doutor Honoris Causa em mais de 30 universidades. Foi também colunista em diversos jornais italianos, tais como Il Giorno, Corriere della Sera e L'Expresso.
Publica diversos livros e coletâneas e de ensaios na década de 70, antes de começar a escrever romances.


O seu primeiro livro de ficção, O Nome da Rosa (1980) cuja ação decorre na primeira metade do século XIV, é um romance histórico que se funde com a narrativa policial e desenvolve uma série de apontamentos teológicos e filosóficos, tornou-se um best-seller e foi adaptado para cinema pelo cineasta francês Jean-Jacques Arnaud, tendo como protagonista o ator Sean Connery.


Umberto Eco esteve várias vezes em Portugal e gostava particularmente da cidade de Tomar, chegando a apelidá-la de "l'ombelico del mondo" (umbigo do mundo), expressão italiana para lugares cuja beleza e importância se equipara à da outrora capital do Império Romano. Em 1984 visitou o Convento de Cristo, monumento que exercia sobre o autor um fascínio, de sobretudo e chapéu à Sherlok Holmes e há quem diga que o viu escrever sentado no Café Paraíso.

"Estive lá duas vezes: uma primeira a convite de Mário Soares, 
durante a qual conheci Saramago, e depois aquando da pesquisa
 para o romance O Pêndulo de Foucault, tendo visitado Tomar por causa dos Templários. 
E ouvi fado numa casa  típica" 
                                                                           Umberto Eco


Foi um defensor da importância do pensamento crítico: "Os livros não são feitos para acreditarmos neles mas para os questionarmos. Quando pensamos num livro não devemos perguntar-nos o que é que diz mas sim o que é que significa".
Autor de inúmeros ensaios sobre semiótica, estética medieval, linguística e filosofia, considerava-se sobretudo um filósofo: "Só escrevo romances aos fins de semana".


Aos 84 anos de idade, o filósofo morreu em sua casa, em Milão, na noite de 19 de fevereiro de 2016.


A par de outras sugestões de leitura, durante este mês, 
Toda a Bibliografia de Umberto Eco 
que a Biblioteca Municipal 
dispõe para empréstimo domiciliário, 
estará patente no nosso habitual cantinho das sugestões.


Só falta o Leitor aparecer

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